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Para quem é a psicanálise? A pergunta que antecede o começo

Atualizado: há 24 horas

“O tratamento analítico não se inicia por um desejo do paciente, mas por um fracasso de suas defesas.”

Sigmund Freud, Análise Terminável e Interminável (1937)


A análise não se inicia porque se quer. O querer pode ser sincero, angustiado, insistente — mas não basta. Há pacientes que desejam entrar em análise como quem busca abrigo, direção ou reparação. Não raro, chegam com discursos já formados, prontos a narrar suas dores e até a justificar seus sintomas. No entanto, não é isso que marca o começo.


O que marca o começo é um ponto de quebra. Algo falha na estrutura de defesas, na explicação habitual, na imagem que se tem de si. A pergunta que se coloca não é se o sujeito está pronto, motivado ou maduro, mas se aquilo que retorna já não pode mais ser silenciado pelas vias conhecidas. A análise começa onde o eu falha.


Composição abstrata com formas geométricas justapostas e linhas curvas em tensão, evocando o deslocamento subjetivo que antecede o início da análise.

Para quem é a psicanálise? Para quem, diante de uma repetição que não cessa, já não encontra repouso na queixa. Para quem fala, mas não se reconhece inteiramente no que diz. Para quem experimenta, sem saber, que algo do mal-estar ultrapassa o campo da vontade.


Não se trata de vocação, tampouco de instrução. A psicanálise não é para os que querem saber mais sobre si, mas para os que, confrontados com o que se repete, já não podem sustentar o mesmo saber. O que a análise oferece não é um esclarecimento, mas uma travessia. Não entrega respostas, mas constrói perguntas.


Essa travessia exige um tipo de escuta que não se reduz à compreensão. Escutar, aqui, não é entender, é sustentar o que não se fecha em sentido. Aquele que se dispõe à análise precisa tolerar o tempo que a palavra exige para tocar o que não foi dito — ou, se dito, não foi ouvido.


A psicanálise é para quem pode suportar que o sintoma diga mais do que ele quer saber. É para quem, diante da própria fala, se surpreende. E nessa surpresa, encontra o começo de algo que não se governa, mas que se pode atravessar.

 
 
 

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